O Médico dos pobres, Bezerra de Menezes

Por Priscila Batista

A extensa obra e legado de nosso ilustre irmão, humilde e caridoso, Adolfo Bezerra de Menezes aquece nosso coração. Um espírita de nascença, como se intitulou, que nesta encarnação também atuou como médico, escritor, empresário e político. Sua trajetória e seu legado são memoráveis e presente na vida dos cidadãos e espíritas do mundo. Um homem além da sua época, que fazia a caridade e mantinha seu respeito aos princípios cristãos muito antes de conhecer o Espiritismo nesta encarnação.

Não temos a pretensão de elencar aqui todos os eventos conhecidos em sua biografia, mas apenas rememorar alguns fatos marcantes como celebração do aniversário de 191 anos desta ilustre e missionário espírito.

Tudo começou, segundo o espírito de Humberto de Campos, na obra psicografada por Francisco Cândido Xavier – Brasil, Coração do Mundo Pátria do Evangelho, com um convite de Ismael, a qual pedimos licença para reproduzir trechos pois não seria possível retratar o cenário com tamanha fidelidade:

“Antes dessa época, quando prestes a findar o Primeiro Reinado, Ismael reúne no Espaço os seus dedicados companheiros de luta e, organizada a venerável assembleia, o grande mensageiro do Senhor esclarece a todos, sobre os seus elevados objetivos….

Depois, encaminhando-se para um dos dedicados e fiéis discípulos, falou-lhe brandamente:

Descerás às lutas terrestres com o objetivo de concentrar as nossas energias no país do Cruzeiro, dirigindo-as para o alvo sagrado dos nossos esforços. Arregimentarás todos os elementos dispersos com as dedicações do teu espírito, a fim de que possamos criar o nosso núcleo de atividades espirituais, dentro dos elevados propósitos de reforma e regeneração. Não precisamos encarecer aos teus olhos a delicadeza de tua missão, mas com a plena observância do código de Jesus e com a nossa assistência espiritual, pulverizarás todos os obstáculos, à força de perseverança e de humildade, consolidando os primórdios da nossa obra, que é a de Jesus, no seio da pátria do seu Evangelho… Se a luta vai ser grande, considera que não será menor a compensação do Senhor, dele que é o caminho, a verdade e a vida…

Havia em toda a assembleia espiritual um divino silêncio. O discípulo escolhido nada pudera responder, com o coração alarmado por doces e esperançosas emoções, mas as lágrimas de reconhecimento caíam-lhe copiosamente dos olhos. …

Daí a algum tempo, no dia 29 de agosto de 1831, no Riacho do Sangue, no Estado do Ceará, nascia Adolfo Bezerra de Menezes, o grande discípulo de Ismael, que vinha cumprir no Brasil uma grande missão.”

Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti, era filho de  Antônio Bezerra de Menezes, tenente-coronel da Guarda Nacional, e de Fabiana de Jesus Maria Bezerra.

Em Serra do Martins, no Rio Grande do Norte, sua inteligência e perspicácia já saltava aos olhos. Aos 11 anos de idade iniciou seus estudos de latim na aula pública e foi convidado, em apenas dois anos, a atuar como professor substituto.

Ingressou no curso de medicina na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1851, sendo residente do hospital da Santa Casa de Misericórdia. Os estudos de medicina somente foram possíveis em virtude das aulas particulares de filosofia e matemática que proferia para arrecadar recursos. Destaque-se o fato de que, mesmo como grande servidor do Cristo, não houve privilégio financeiro para os estudos.

Graduado em 1856 iniciara seu trabalho, atendendo a um convite, como assistente de seu antigo professor Dr. Manuel Feliciano Pereira Carvalho que fora nomeado como Cirurgião-mor pelo Governo Imperial. Em 1858, Bezerra foi nomeado oficialmente como assistente do Corpo de Saúde do Exército, no posto de Cirurgião-Tenente.

Casou-se com Maria Cândida de Lacerda em 1858, tendo com ela dois filhos, porém esta viria a falecer de mal súbito em março de 1863.  Em 1865, casou-se novamente com Cândida Augusta de Lacerda Machado, irmã por parte de mãe de sua primeira esposa, e com quem teve mais sete filhos.

Bezerra de Menezes atuou como Vereador da cidade do Rio de Janeiro por dois mandatos, entre 1861 à 1868, e também como deputado geral pela Província do Rio de Janeiro, de 1877 a 1885, ano em que encerrou a sua carreira política. Destacamos a vanguarda de sua atuação pois naquela época já lutava por projetos de lei que regulamentava o trabalho doméstico e o combate à poluição.

Em meio a todos estes eventos, Dr. Bezerra era também o médico dos pobres pois seu consultório era muito frequentado, especialmente por pessoas que não podiam pagar pela consulta e tratamento.

Fato notório no meio espírita, e retratado em 2008 no filme brasileiro “Bezerra de Menezes – O Diário de um Espírito” dirigido por Glauber Filho e Joe Pimentel, o momento em que Bezerra doa o seu anel de grau em medicina a uma mãe aflita que não tinha condições financeiras para comprar os medicamentos que seu filho precisava.

A medicina para Bezerra era profissão sagrada e a exercia com todos os seus recursos. A ele é atribuída a frase abaixo: 

“O médico verdadeiro é isto: não tem o direito de acabar a refeição, de escolher a hora, de inquirir se é longe ou perto… O que não acode por estar com visitas, por ter trabalhado e achar-se fatigado ou por ser alta à noite, mal o caminho e o tempo, ficar perto ou longe do morro; o que sobretudo pede um carro a quem não tem com que pagar a receita, ou diz a quem lhe chora à porta que procure outro – esse não é médico, é negociante da medicina, que trabalha para recolher capital e juros dos gastos da formatura. “

Durante a campanha abolicionista, em 1869, publicou a obra “A escravidão no Brasil e as medidas que convém tomar para extingui-la sem danos para a Nação“, defendendo a liberdade dos escravos e a sua inserção e adaptação na sociedade através da educação.

E somente em 1875 conheceu a doutrina espírita, o que foi um divisor de águas. Em uma entrevista realizada em 1892 pela Federação Espírita Brasileira e publicada no periódico O Reformador, Bezerra comenta sobre sua primeira leitura do Livro dos Espíritos, de Allan Kardec:

Deu-mo na cidade e eu morava na Tijuca, a uma hora de viagem de bonde. Embarquei com o livro e, como não tinha distração para a longa viagem, disse comigo: ora, Deus! Não hei de ir para o inferno por ler isto… Depois, é ridículo confessar-me ignorante desta filosofia, quando tenho estudado todas as escolas filosóficas. Pensando assim, abri o livro e prendi-me a ele, como acontecera com a Bíblia. Lia. Mas não encontrava nada que fosse novo para meu Espírito. Entretanto, tudo aquilo era novo para mim!… Eu já tinha lido ou ouvido tudo o que se achava no ‘O Livro dos Espíritos’. Preocupei-me seriamente com este fato maravilhoso e a mim mesmo dizia: parece que eu era espírita inconsciente, ou, mesmo como se diz vulgarmente, de nascença.

Em  agosto de 1886, mesmo diante do forte preconceito quanto à Doutrina dos Espíritos, e da sua formação originalmente católica, Dr. Bezerra, aos 55 anos, surpreendera a sociedade e seus familiares posicionando-se publicamente como espírita para aproximadamente duas mil pessoas no salão de conferências da Guarda Velha, no Rio de Janeiro, evento este publicado no periódico “O Paiz” de maior circulação da época. Tal declaração afetou profundamente a relação com seus familiares católicos.

Inicia então publicamente sua missão no movimento espírita o qual foi e é extremamente frutífera e produtiva, sendo um grande servidor do Cristo até o presente momento.

Em 1889, Bezerra foi eleito presidente da Federação Espírita Brasileira iniciando o estudo sistemático de “O Livro dos Espíritos”, atuando na redação da revista o Reformador. Foi doutrinador de espíritos obsessores, organizou o Congresso Espírita Nacional reunindo 34 delegações de instituições de diversos estados. E com muita firmeza oficiou, após assumir a Presidência do Centro da União Espírita do Brasil em 1890, ao presidente da República, Marechal Deodoro da Fonseca, em defesa dos direitos e da liberdade dos espíritas em face de certos artigos do Código Penal Brasileiro de 1890.

Além de traduzir o livro Obras Póstumas de Allan Kardec, publicado em 1892, publicou mais de 40 obras, foi um intelectual.

Bezerra de Menezes retornou a pátria espiritual aos 68 anos em abril de 1900, no Rio de Janeiro. Na obra Lindos Casos de Bezerra de Menezes, de Ramiro Gama nos relata o momento de seu desencarne:

“A folhinha marcava 11 de abril de 1900!

 Bezerra de Menezes, o Apóstolo brasileiro, o Médico dos Pobres, o Estuário de todas as súplicas, de problemas variados e dolorosos, de irmãos sofredores e pobres, agonizava…

Os olhos brilhantes, bem abertos, transmitiam aos Familiares e aos Irmãos e Amigos presentes a confiança da sua Fé, o Amor pelo seu e nosso Mestre e a sua preocupação pelos seus doentes. E balbuciava, de quando em quando, com dificuldade e sentidamente;

Coitados, são tantos à minha espera! A Mãe do Céu há de atendê-los!

Sentindo que se aproximava a hora de seu decesso, pediu que o ajudassem a levantar-se um pouco e, com a cabeça erguida, olhos voltados para o Alto, assim orou, baixinho e entre lágrimas, deixando-nos suas últimas palavras como a Lição permanente da sua grandeza Espiritual, de seu Espírito totalmente libertado dos vícios e ligado à Causa do Nosso Senhor Jesus Cristo:

Virgem Santíssima, Rainha do Céu, Advogada de nossas súplicas junto ao Divino Mestre e a Deus todo Poderoso, eu Te peço não que deixe de sofrer, mas para que meu pobre espírito aproveite bem todo o sofrimento e, por fim, Mãe querida, eu te peço pelos meus lrmãos que ficam, por esses pobres Amigos, doentes do corpo e da alma, que aqui vieram buscar no teu humilde servo uma migalha de conforto e de amor. Assiste-os, por Caridade, dá-lhes, Senhora, a Tua Paz, a Paz do Cordeiro de Deus que tira os pecados do Mundo, Nosso Senhor Jesus Cristo! Louvado seja Teu Nome! Louvado seja o Nome de Jesus! Louvado seja Deus!

E desencarnou!

Muitos Irmãos presentes ao decesso de Bezerra de Menezes sentiram que o quarto foi inundado de intensa luz, que formosíssimas visões rodeavam-lhe o leito, recebendo-lhe o Espírito evangelizado, satisfeito por haver vencido sua Grande e Benfeitora Missão.

Duas Assembleias ali se achavam. Uma da Terra e outra do Céu.

A da Terra dizia

Não partas, bom Velhinho, fico conosco para nosso consolo e nossa alegria!

 A do Céu exclamava:

– Vem, alma boa, buscar o prêmio do teu esforço, da Vitória de tua Missão cristã!

E ambas, diziam numa só voz: Bendito sejas: Benditos seja Bezerra de Menezes! Louvado seja Deus!”

Nosso irmão, segue trabalhando incansável, comandando uma falange de espíritos servidores, sendo reconhecido como o Venerável da Fraternidade dos Humildes. E até hoje Bezerra de Menezes é invocado por todos nós, mães, pais e sofredores do mundo todo, para que possa aliviar as dores do corpo, da alma e nos apontar caminhos. Graças a mediunidade de Divaldo Franco e outros, nos brinda com suas mensagens de esperança, de alegria e nos orienta na jornada terrena.

A pergunta 918 do Livro dos Espíritos Kardec questiona: Por que indícios se pode reconhecer em um homem o progresso real que lhe elevará o Espírito na hierarquia espírita?  A resposta foi:

 “O Espírito prova a sua elevação quando todos os atos de sua vida corpórea representam a prática da Lei de Deus e quando compreende antecipadamente a vida espiritual”. 

Em nota, Kardec comenta: “O verdadeiro homem de bem é o que pratica a lei de justiça, amor e caridade na sua maior pureza. Se interroga a própria consciência sobre os atos que praticou, perguntará se não violou essa lei, se não fez o mal, se fez todo o bem que podia, […] se fez aos outros tudo quanto queria que os outros lhe fizessem”.

Bezerra de Menezes era um homem de bem, símbolo de união e humildade, de trabalho e amor ao próximo que a misericórdia divina nos proporcionou o convívio, missionário de Ismael e do Cristo, seguirá sempre presente em nossas vidas.

Conforme Ramiro Gama afirma em sua obra, “Bezerra de Menezes não fundara Hospitais, nem Escolas, nem Asilos, nem Albergues, nem Farmácias. Mas, ele sozinho, por si mesmo era tudo isto: hospitalizava, esclarecia, asilava, albergava, medicava, salvava irmãos, encaminhando-os ao roteiro salvacionista do Mestre querido!

Priscila Batista é voluntária na Casa dos Essênios da União Fraternal dos Discípulos de Jesus, em Sorocaba.

Fontes:

O Médico dos pobres, Bezerra de Menezes
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4 ideias sobre “O Médico dos pobres, Bezerra de Menezes

  • 28 de agosto, 2022 em 1:16 pm
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    Olá, Priscila! Que bela inspiração! Bela tb sua iniciativa de nos trazer essas preciosas informações sobre o incansável Dr Bezerra que tanto nos socorre e fortalece a nossa fé. Emocionante.
    Obrigado Priscila.

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    • 28 de agosto, 2022 em 8:48 pm
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      Minha querida Priscila…vc inundou meu coração de emoção e alegria por ver este Ser Grandioso homenageado com tanta doçura e conhecimento, embasamentos teóricos valorosos…gratidão!!!

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  • 28 de agosto, 2022 em 4:31 pm
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    Parabéns Priscila. Adorei suas referências e como é maravilhoso ler, refletir sobre esse grande espírito Dr Bezerra de Menezes, percebo como somos abençoados. Um grande abraço.

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  • 2 de setembro, 2022 em 12:53 pm
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    Pri, maravilhoso artigo… Estou para ler há algum tempo o Livro “A Vida e a Obra de Bezerra de Menezes”… Depois deste artigo, não há desculpas para não ler o quanto antes :).
    Abraço 🙂

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